Procurador envolvido em escândalo de suborno aos indígenas de Autazes divulga comunicado contraditório
Amazonas – Após a polêmica que envolve o procurador Fernando Merloto Soave e a juíza, Jaiza Maria Pinto Fraxe, da 1ª Vara Federal Cível do Amazonas, foi emitida uma nota na última quarta-feira (13) em defesa do procurador, por meio do Ministério Público Federal (MPF), apontando que o recurso depositado em juízo pela Potássio do Brasil poderia, sim, ser utilizado para custear o transporte e locomoção dos indígenas Mura para a Inspeção Judicial que ocorreu em 2022, coordenado pela juíza da Vara Federal. Porém a própria decisão da Justiça Federal em 2022 aponta para o contrário do que o procurador defende e compromete seu ato diante da opinião pública.
De acordo com a nota do MPF, “no áudio o procurador esclarece sobre a possibilidade de ressarcimento dos custos de locomoção dos indígenas, que seria feito através de recursos da própria empresa Potássio do Brasil, depositados em juízo para a Justiça Federal do Amazonas”.
No entanto, a informação da nota do MPF contradiz o que decidiu a própria juíza Jaiza Fraxe, em 18/03/2022 (decisão em anexo), onde a mesma estabelece que os valores depositados em juízo pela Potássio do Brasil deveriam ser utilizados somente no contexto da Consulta ao Povo Mura e não para Inspeção Judicial, como MPF defende.
No item 7.3 da decisão a juíza deixa claro: “…o juízo autorizou o depósito dos valores pela empresa requerida, a qual deve, sim, custear as despesas referentes ao esclarecimento dos fatos junto às aldeias, comunidades e famílias que serão afetadas caso licenciado, autorizado e concretizado o empreendimento”.
Portanto, a autorização de uso de recursos da Potássio do Brasil depositados em juízo eram voltados especificamente ao esclarecimentos necessários que ocorrem dentro do processo de Consulta do Povo Mura e não dentro de uma Inspeção Judicial da juíza Jaíza Fraxe que ocorreu em 2022, o qual a própria juíza decidiu: “Intimem-se as partes e assistente simples, por e-mail e com urgência para, caso queiram, acompanhar a inspeção judicial, devendo cada um arcar com o ônus de deslocamento”, é o que informa o item 9 da decisão judicial.
Vale destacar que os indígenas Mura de Autazes são uma das partes arroladas ao processo que corre na Justiça Federal sobre a produção do fertilizante de potássio, em Autazes e as informações da reportagem do CM7 podem ser verificadas, com acesso público, pelo ID 974395186, na Justiça Federal, pela data de 18/03/2022 (Acesso eletrônico: n° 0019192-92.2016.4.01.3200).
A nota do MPF também é contraditória pois na própria nota é esclarecido que os recursos alocados em juízo pela Potássio do Brasil deveriam ser destinados exclusivamente para o processo de Consulta do Povo Mura e não para Inspeções Judiciais. Veja abaixo:
“A inspeção judicial em questão foi marcada em 2022 para melhor avaliar a situação na região, diante de informações de que estavam ocorrendo pressões, cooptações e ameaças contra indígenas Mura na área. Neste contexto, já havia recursos financeiros da empresa Potássio do Brasil depositados para a Justiça Federal a fim de dar andamento às tratativas sobre o protocolo de consulta aos indígenas Mura.
De acordo com a Convenção nº 169 da OIT, bem como normativas vigentes, deve o empreendedor arcar com os custos socioambientais, sejam estudos sobre o licenciamento ambiental, seja a própria consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas e/ou tradicionais potencialmente impactados por empreendimento, nos termos da Convenção nº 169 da OIT.”
Relembre o Caso:
A polêmica ganhou notoriedade quando uma gravação obtida por O Antagonista revelou que o procurador Fernando Merloto Soave ofereceu-se para pagar despesas dos indígenas Mura em uma reunião sobre o projeto Potássio Autazes. A mesma gravação menciona que o procurador combinou o pagamento com a juíza Jaíza Maria Pinto Fraxe, da 1ª Vara Federal Cível do Amazonas, o que levanta questionamentos éticos sobre a atuação dos envolvidos.
No mesmo áudio, o procurador afirma que já combinou o pagamento das despesas com a juiza Jaíza Maria Pinto Fraxe, da 1ª Vara Federal Cível do Amazonas. Por lei, procuradores e juízes não podem fazer “parceria” e nem atuar contra ou a favor de partes envolvidas em processos judiciais. Essa justificativa foi utilizada, por exemplo, para anular sentenças da Operação Lava-Jato.
“A juíza Jaíza está indo pra lá. Eu estou indo pra gente conversar com todos. Todo e qualquer custo que vocês tiverem de combustível, de deslocamento, é só pegar o recibo que vai ser ressarcido. Já confirmei com a juíza Jaíza”, diz Merloto no áudio.
Os pedidos do procurador contra o projeto de extração de potássio em Autazes têm sido acolhidos pela juíza Jaíza. Recentemente, a senadora Tereza Cristina anunciou que acionaria o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público para apurar um suposto “ativismo judicial” contra o projeto, considerado a maior jazida de fertilizantes do Brasil.
Confira documento na íntegra: